Pessoas Deveras Importantes

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

O recanto do chofer

Não consigo dar-me conta do tempo exato que se passou, até minha família se mudar parcialmente para a pequena casa adjacente ao estabelecimento. Aquela casa era acanhada, mas tinha um terreiro muito grande, que servia de depósito a céu aberto para os tambores usados para transportar combustível.

Logo no primeiro instante, naquela nova morada, eu me senti fascinado pelo constante entra e sai de choferes e ajudantes na loja destinada ao comércio de autopeças e óleos lubrificantes. No pátio, parava no ar um cheiro de diesel e gasolina, mesclado com o suor dos cassacos, com destino ao povoado de Santa Bernadete, que eram transportados em montão nas carrocerias abertas dos caminhões de carregar terra.

O famoso Recanto do Chofer era um prédio grande e mal conservado que abrigava um modesto comércio de hotelaria de beira de estrada. Compreendia no todo: uma bomba de gasolina, uma edícula, um restaurante e um dormitório. Instalado nos fundos do salão onde serviam refeições avulsas, o dormitório abrigava duas dezenas de quartos ao longo de um estreito corredor, que acabava em quatro despojados banheiros coletivos.

Tínhamos o hábito, quando crianças, de nos dizermos senhores de tudo que víamos, mesmo de alguma coisa que não se podia tocar, como por exemplo, uma nuvem no céu. Quem primeiro gritasse: “aquilo é meu”, tornava-se possuidor da coisa avistada.

Assim que entrei no lavatório do hotel, avistei um gato rajado que se fez, no grito, minha propriedade. Eu achava que o gato fora abandonado pelos antigos moradores ou mesmo não quis acompanhar seus donos, pois como dizia minha mãe, os gatos são como as vitalinas, se afeiçoam mais pelas casas do que pelas pessoas.

Dávamos nome a todos os bichos que avistávamos, como fez Adão a mando de Deus, dando nome a todos os animais que passaram diante dele. Para assegurar meu domínio sobre o bichano, assim que pus as mãos no tal vira-lata tratei de batizá-lo e dei a ele o nome de Alpino, pois vivia nos muros caiados, caçando bribas. Afinal, quem dá o nome é quem tem poder sobre aquele que recebe o nome. É assim, desde a criação do mundo.

Naquele tempo, as crianças dormiam na sala. A minha rede ficava emparelhada com a do meu irmão, Minco. Eu tinha um caráter propenso a sentir medo.

Como se isso não bastasse, desenvolvera uma exacerbada sensibilidade para chorar. Eu me punha a soluçar sem qualquer motivo aparente. Muitas noites, quando minha alma acovardada por obscuros temores despertava-me com pesadelos, sob o domínio daquele pavor imaginário eu buscava consolo na rede do meu irmão.

(in O íntimo ofício: memórias, Scortecci, São Paulo, 2007)

2007/2011 © Z.A. Feitosa, todos os direitos reservados

3 comentários:

  1. hola como estas? gracias por tu comentario, pero tuve problema con ese blog, ahora es www.yotrospaisajes9.blogspot.com

    un abrazo!

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  2. Estas palabras mensajeras a traves de las distancias, deseo lleguen a ti y seres queridos , portadoras de cariño y energias de BienEstar:
    Que tú corazón esté ligero y tus bolsillos pesados.
    Que la Buena suerte te persiga.
    Que cada día y cada noche tengas muros contra el viento, y un techo para la lluvia.
    Que tengas alimento junto a la fogata y, risas para consolarte.
    Que aquellos a quienes amas estén cerca de ti,

    Y........todo lo que tú corazón desee!
    .
    FELIZ NAVIDAD!!!
    .
    Abuela Cyber

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Z.A. Feitosa (www.feitosa.net)